O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) André Mendonça decidiu que a lei que restringiu as saídas temporárias de presos, conhecidas como “saidinhas”, não pode ser aplicada retroativamente a quem já estava cumprindo pena e tinha acesso a esse benefício. A análise foi feita no habeas corpus de um preso em Minas Gerais, condenado por roubo com uso de arma de fogo.
O Juízo da Execução Penal havia inicialmente concedido ao preso o direito ao trabalho externo e às saídas temporárias. No entanto, esses benefícios foram revogados após a aprovação da Lei 14.843/24, em março. Tentativas de reverter essa suspensão foram negadas pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJ-MG) e pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), levando o caso ao STF.
Na decisão proferida nesta quinta-feira (28), Mendonça determinou que os benefícios de saídas temporárias e trabalho externo sejam mantidos, embora a decisão valha apenas para este caso específico. O ministro não chegou a julgar o habeas corpus em si, mas ordenou a preservação dos direitos originalmente concedidos ao preso.
Mendonça diz que lei só pode retroagir se for mais favorável ao condenado
Mendonça argumentou que a nova legislação só poderia retroagir se fosse “mais favorável ao sentenciado”. Geralmente, o STF não analisa um habeas corpus antes de esgotadas todas as possibilidades de recurso nas instâncias inferiores, mas o ministro considerou que o caso justificava uma “providência excepcional”.
Ele explicou que, conforme o entendimento do STF, “a legislação sobre execução penal atende aos direitos fundamentais dos sentenciados”. Assim, a individualização da pena é um direito fundamental do acusado, sendo aplicada em três etapas: legislativa (fixação das penas máximas e mínimas), judicial (aplicação da pena na sentença) e executória (cumprimento da pena).
Mendonça observou que a legislação anterior só vedava saídas temporárias para “condenados por crime hediondo com resultado morte”. Antes da nova lei, a Lei de Execução Penal (Lei 7.210/84) permitia saídas temporárias por até sete dias, quatro vezes ao ano, para visitas à família ou atividades de reintegração social.
A nova lei ampliou a restrição, impedindo saídas temporárias de presos do regime semiaberto para visitar familiares, permitindo o benefício apenas para detentos que cursam o supletivo profissionalizante, ensino médio ou superior.
“Assim, entendo pela impossibilidade de retroação da Lei nº 14.836, de 2024, no que toca à limitação aos institutos da saída temporária e trabalho externo para alcançar aqueles que cumprem pena por crime hediondo ou com violência ou grave ameaça contra pessoa — no qual se enquadra o crime de roubo —, cometido anteriormente à sua edição, porquanto mais grave (lex gravior)”, decidiu Mendonça.
O projeto de lei que restringe as “saidinhas” foi aprovado pelo Senado em 20 de fevereiro. Um mês depois, a Câmara concluiu a análise e aprovou as alterações feitas pelos senadores. Em abril, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) vetou o principal ponto da proposta, que proibia saídas temporárias de presos para visitas a familiares.
O veto de Lula foi derrubado pelo Congresso na terça-feira (29). Outros três pontos da proposta foram sancionados: a exigência de exame criminológico para progressão de regime, uso de tornozeleiras eletrônicas durante as saídas temporárias, e a proibição do benefício para presos que tenham praticado crime hediondo.